(contrariando a Constituição, STF reconhece “união estável” entre pessoas do mesmo sexo)
A Constituição Federal de 1988 reconheceu como entidade familiar a “união estável”
entre o homem e a mulher:
Art. 226, § 3º.
Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
Conforme reconhece o ministro Ricardo Lewandowski, “nas discussões
travadas na Assembleia Constituinte a questão do gênero na união
estável foi amplamente debatida, quando se votou o dispositivo em tela,
concluindo-se, de modo insofismável, que a união estável abrange,
única e exclusivamente, pessoas de sexo distinto”[1]. Logo, sem violar a
Constituição, jamais uma lei poderia reconhecer a “união estável”
entre dois homens ou entre duas mulheres. De fato, o Código Civil,
repetindo quase literalmente o texto constitucional, reconhece a “união
estável” somente
entre o homem e a mulher:
Art. 1.723.
É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.
A não ser que se reformasse a Constituição, os militantes
homossexualistas jamais poderiam pretender o reconhecimento da união
estável entre dois homossexuais ou entre duas lésbicas. Isso é o que
diz a lógica e o bom senso.
No julgamento ocorrido em 4 e 5 de maio de 2011, no entanto, o
Supremo Tribunal Federal, ferindo regras elementares da coerência
lógica, reconheceu
por unanimidade (!) a “união estável” entre duplas homossexuais.
Naqueles dias foram julgadas em conjunto duas ações: a Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental 132 (ADPF 132) proposta em 2008
pelo governador Sérgio Cabral, do Estado do Rio de Janeiro e a Ação
Direta de Inconstitucionalidade 4277 (ADI 4277) proposta em 2009 pela
vice-Procuradora Geral da República Débora Duprat, na época exercendo
interinamente o cargo de Procuradora Geral da República. O que ambas as
ações tinham em comum era o pedido de declarar o artigo 1723 do Código
Civil inconstitucional
a menos que ele fosse interpretado de modo a incluir as duplas homossexuais na figura da “união estável”.
O pedido, por estranho (e absurdo) que fosse, foi acolhido pelo
relator Ministro Ayres Britto e por toda a Suprema Corte. Foi impedido
de votar o Ministro Dias Toffoli, que já havia atuado no feito como
Advogado Geral da União (em defesa da “união” homossexual, é óbvio).
Dos dez restantes, todos votaram pela procedência do pedido.
Acompanhemos o raciocínio do relator Ayres Britto.
Segundo ele, o texto do artigo 1723 do Código Civil admite
“plurissignificatividade”[2], ou seja, mais de um significado. O
primeiro (e óbvio) significado é que o artigo reconhece como entidade
familiar a união estável
somente entre um homem e uma mulher,
excluindo a união de pessoas do mesmo sexo. O segundo significado
(contenha-se para não rir) é que o artigo reconhece como entidade
familiar a união estável,
por exemplo, entre um homem e uma
mulher, mas sem excluir as uniões homossexuais. Para Ayres Britto, a
primeira interpretação é inconstitucional, por admitir um “preconceito”
ou “discriminação” em razão do sexo, o que é vedado pela Constituição
Federal (art. 3º, IV). Somente a segunda interpretação, por ele
descoberta (ou criada) é constitucional. Concluiu então seu voto
dizendo: “dou ao art. 1.723 do Código Civil interpretação conforme à
Constituição para dele excluir qualquer significado que impeça o
reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do
mesmo sexo como ‘entidade familiar’, entendida esta como sinônimo
perfeito de ‘família’. Reconhecimento que é de ser feito segundo as
mesmas regras e com as mesmas consequências da união estável
heteroafetiva”[3].
Uma das consequências imediatas do reconhecimento da “união estável”
entre pessoas do mesmo sexo é que tal união poderá ser convertida em
casamento, conforme o artigo 1726 do Código Civil: “A união estável
poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos companheiros ao
juiz e assento no Registro Civil”. De um só golpe, portanto, o Supremo
Tribunal Federal reconhece a “união estável” e o “casamento” de
homossexuais!
Para se avaliar quão disparatada é essa decisão, observe-se que, embora a “união estável” e o casamento sempre ocorram
entre um homem e uma mulher, não ocorrem
entre qualquer homem e qualquer mulher.
Não pode haver casamento, por exemplo, entre irmão e irmã, entre pai e
filha ou entre genro e sogra. Esses impedimentos baseados na
consanguinidade e na afinidade (art. 1521, CC) aplicam-se também à
“união estável” (art. 1723, § 1º, CC). A diversidade dos sexos é
necessária, mas não basta. Não se reconhece “união estável” entre um
homem e uma mulher “impedidos de casar” (art. 1727).
Será que os Ministros do STF considerariam inconstitucionais estas
proibições do casamento de parentes próximos? Em outras palavras: é
“preconceituosa” e “discriminatória” a lei que proíbe as uniões
incestuosas? Parece que a resposta seria afirmativa. Pois embora o
incesto seja uma perversão sexual, ele ainda está abaixo do
homossexualismo, que foi admitido pela Suprema Corte como meio de
constituição de uma “família”.
E quanto à pedofilia? Seria sua proibição um simples “preconceito de
idade”? Esse é o argumento da associação NAMBLA de pedófilos dos
Estados Unidos[4], que usa a palavra “ageism” (“idadismo” ou etarismo)
para criticar a proibição de praticar atos homossexuais com crianças.
Andemos adiante. Quando a Constituição fala que “todos são iguais
perante a lei” (art. 5º) não diz explicitamente que este “todos” se
refere apenas aos seres humanos. Estariam os animais aí incluídos?
Seria, portanto, inconstitucional a proibição de uma “união estável” ou
de um “casamento” entre uma pessoa e um animal? O bioeticista
australiano Peter Singer usa o termo “especismo” para designar o
“preconceito” e “discriminação” contra os animais em razão de sua
espécie. Num futuro próximo, não só a pedofilia, mas também a
bestialidade (prática sexual com animais) poderia ser admitida com base
no mesmo argumento que admitiu a “família” fundada no homossexualismo.
Discriminação contra os castos
Imagine-se que dois amigos compartilhem a mesma habitação a fim de
fazerem um curso universitário. Enquanto eles viverem castamente, não
terão qualquer direito especial. Se, porém, decidirem praticar entre si
o vício contra a natureza de maneira “contínua, pública e duradoura”,
constituirão, se quiserem, uma “família”, com todos os direitos a ela
anexos. A decisão do STF constitui um privilégio para o vício em
detrimento dos que vivem a castidade.
Perda da segurança jurídica
Com o golpe de 4 e 5 de maio de 2011, o Estado brasileiro perdeu
toda a segurança jurídica. Se a Suprema Corte reserva a si o direito
não só de legislar (o que já seria um abuso), mas até de
reformar a Constituição,
mudando o sentido óbvio de seu texto em favor de uma ideologia, todo o
sistema jurídico passa a se fundar sobre a areia movediça. A
vergonhosa decisão demonstrou que a clareza das palavras da
Constituição não impede que os Ministros imponham a sua vontade, quando
conflitante com o texto constitucional.
A Frente Parlamentar em Defesa da Vida – contra o Aborto – pretende
apresentar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que acrescente
as palavras “
desde a concepção” no artigo 5º,
caput,
que trata da inviolabilidade do direito à vida. Em tese, essa emenda,
se aprovada, sepultaria toda pretensão abortista no país. Isso se
pudéssemos contar com a seriedade da Suprema Corte. Essa seriedade,
porém, foi perdida com a admissão das “uniões” homossexuais. É de se
temer que, mesmo diante da expressão “desde a concepção”, alguns
Ministros do STF inventem uma peculiar “interpretação” do texto que não
exclua o direito ao aborto.
Caso inédito
A monstruosidade lógica do julgamento da ADPF 132 / ADI 4277
ultrapassa tudo o que se conhece de absurdo em alguma Corte
Constitucional. É verdade que a sentença
Roe versus Wade,
emitida em 22 de janeiro de 1973 pela Suprema Corte dos EUA, declarou
inconstitucional qualquer lei que incriminasse o aborto nos seis
primeiros meses de gestação. Esse golpe foi dado com base no direito da
mulher à privacidade e na negação da personalidade do nascituro. No
entanto, a decisão não foi unânime. Dos nove juízes, houve dois que se
insurgiram contra ela. No Brasil, porém, para nosso espanto e vergonha,
não houve dissidência. Todos os membros do STF admitiram enxergar
uma inconstitucionalidade que não existe no artigo 1723 do Código Civil.
Isso faz lembrar o conto “A roupa nova do imperador”, cujos tecelões
afirmavam que só não era vista pelos tolos. Enquanto o monarca
desfilava com camiseta e calça curta, todos – com exceção de uma
criança – se diziam admirados com a beleza da inexistente roupa. Desta
vez, os Ministros, temerosos de serem considerados não tolos, mas
“preconceituosos”, “retrógrados” e “homofóbicos” acabaram todos por
enxergar uma inconstitucionalidade inexistente. Espera-se o grito de
alguma criança para acabar com a comédia.
Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz.